segunda-feira, 2 de maio de 2011

John & Cynthia Lennon

Primeiramente, gostaria de enfatizar a difícil relação que John Lennon possuía com a sua esposa, Cynthia. Mãe de seu primeiro filho, Julian, Cynthia representava a tradicional família de classe média britânica, seus valores morais e sua conduta social, o que esbarrava no comportamento mais libertário e desregrado de John Lennon. O filme procura deixar claro esses detalhes, enfatizando na total apatia e indiferença que compunha o dia-a-dia de Lennon com sua primeira esposa. Falta de amor? Um casamento por fachada?

À primeira vista, esta é, sim, a impressão que se tem da relação de ambos. As atuações de Cristopher Eccleston e Claudie Blakley procuram mostrar o clima de total distanciamento das personagens: Enquanto esta está interessada em manter o ambiente familiar de acordo com o protocolo, e fazer com que John se adeque a este, aquele está imerso em diversos outros assuntos que o afastam de todo este ambiente, e inclusive de seu filho. A administração dos Beatles, os problemas que estes enfrentaram após o retorno da Índia, as “escapulidas” de John. A forma com que as imagens são organizadas e postas na edição final demonstra que todos estes são fatores se evidenciam de forma mais latente do que o relacionamento de John e Cynthia, como se esse fosse de fato um compromisso institucionalizado, um fardo que não poderia ser rompido por ambos, visto as regras da sociedade.

(Um fator que me esqueci de evidenciar no post passado foi a forma escolhida pelo diretor para contextualizar a narrativa do filme. Diferente de vários outros filmes autobiográficos, que encenam toda e qualquer passagem da vida do personagem retratado, este optou por inserir registros visuais verídicos, contracenando assim com as imagens fictícias produzidas posteriormente. Muitos podem questionar tal atitude, se a ideia era de se conseguir um maior efeito de autenticidade a partir dessa mescla de imagens de época e encenações atuais. Fica aqui o parênteses.)

Analisando algumas cenas, procuro entender alguns dispositivos usados pela direção no intuito de orientar os atores. Não há qualquer cena em que ambos estejam felizes ou confortáveis um com o outro, sempre há uma divergência de ideias e opiniões. Os semblantes dos atores são sempre soturnos e melancólicos, o que sugere uma vontade, ainda que mínima, de comunicarem. A trilha sonora e os movimentos (?) da câmera enfatizam essa difícil relação entre marido e mulher. Não há, neste período, um ambiente familiar, embora Cynthia acuse John de não sabe o que é uma família.

Deixo aqui a cena que representa o divórcio dos dois, e a última aparição de Claudie Blakley no filme. Com a presença de um advogado, seus pais, e, obviamente, John Lennon, Cynthia procura fazer um acordo com John para que possam continuar seu casamento, embora esteja totalmente abalada com a relação amplamente divulgada de John com Yoko Ono (Naoko Mori). Aqui, se tem uma ótima visão daquilo que caracterizou John Lennon como um ser sarcástico e, muitas vezes, cruel. A atuação de Eccleston deixa claro que a decisão de Lennon era um caminho sem volta, um importante passo. Ao me deparar com essa cena, sempre me questiono se esta interpretação queria realmente passar uma atitude decisiva do personagem, ou a sua reação frente a uma situação que influenciaria todos os seus passos foi construída por um imenso sentimento de fraqueza e fragilidade, mesmo com a ideia de que seu filho poderia ficar longe. Aliás, este é outro ponto evidente do filme. Não há qualquer relação de afeto dos pais de Julian com este. Falo dos pais, porque, se perceberem, Claudie Blakley e Charlie Coulthard – ator infantil que representa Julian, sequer contracenam.

Na verdade, deve ter sido o propósito do diretor. Espero ter deixado claro algumas destas questões que me propus a desenvolver. Fica aí o vídeo e, mais tarde, comentários sobre outros aspectos do filme.

domingo, 1 de maio de 2011

Believing in anything: Analisando o filme Lennon Naked

A primeira vez que vi esse filme para download, achei que não seria digno de sequer uma olhada. Mas, agora que estou escrevendo este texto, confesso que foi bom ter me aventurado e olhado um pouco mais sobre essa adaptação de uma época bem conturbada e efervescente, tanto em termos culturais quanto políticos. Nada seria mais desafiador do que observar a tudo isso pelo ponto de vista de um dos maiores ícones da época, e dos dias atuais também, mesmo mais de 30 anos após sua morte: John Lennon.

Lançado em 2010, e produzido pela BBC, Lennon Naked propõe um olhar sobre a vida de John Lennon (Cristopher Eccleston) de 1964 a 1971. O filme foca principalmente a partir de 1967, com a morte do empresário de longa data dos Beatles, Brian Epstein (Rory Kinnear), a deterioração do relacionamento entre os membros da banda, a ruptura de John com Cinthia (Claudie Blakley), sua primeira mulher, uma nova vida com Yoko Ono (Naoko Mori), e a tumultuada relação com seu pai (Cristopher Fairbanks), cujo reencontro após 17 anos de ausência se transforma em um processo intenso e doloroso, para ambos.

O filme começa em 1964, durante as filmagens daquele que seria A Hard Day’s Night, o primeiro longa metragem dos Beatles, inspirado no álbum homônimo. Após várias súplicas, Brian atende ao pedido do pai de John e arranja um encontro entre os dois, que se dá de forma brusca e conflituosa. Pude perceber que a atuação de Eccleston procura evidenciar não só o desconforto de um reencontro de dois familiares após uma longa data, mas também a situação-limite em que John Lennon se encontrava. Havia, de fato, uma pressão interna muito forte para este reencontro, e isso fica claro nas cenas posteriores onde ambos se encontram. Notoriamente reconhecido por sua frieza, arrogância e sarcasmo evidente, essa cena inicial evidencia até que ponto a fama catalisa as angústias de John: este se apresenta sociável e carismático ao grupo de fãs histéricas que o perseguem, ou ao motorista que lhe pede um autógrafo para sua esposa. Porém, frente ao seu pai, seu comportamento mescla o desprezo e o ódio, destacando a sua dificuldade de comunicação e expressão, que definirá todas as decisões que tomou a frente, além do tom melancólico do filme.

Após essa cena inicial, há um salto de três anos, e diversas mudanças também ocorrem na composição estética do filme: A película, até então preto e branco, torna-se colorida, e há a presença de cenários mais bem iluminados, o que dá uma impressão ambígua de serenidade, que é tudo que não se vê no filme. Em 1967, a banda lança o álbum Magical Mystery Tour, o primeiro depois da morte de Brian Epstein. A relação entre os membros ainda é estável e produtiva, mas todos demonstram a preocupação de continuar sem a orientação e direção daquele que fora seu empresário bem antes do sucesso.

A partir deste ponto, procurarei fazer esta análise de forma a separar tópicos, elucidando situações diversas que dão corpo à narrativa do filme. Evidencio diversas ao invés de ‘distintas’, por que essas, de fato, não estão desconexas. Entretanto, para a elaboração de qualquer relato sobre algum fato, é necessário ‘descontruir’ o mesmo, dando corpo assim à mensagem que se quer passar na obra. Só vivendo mesmo para apreender mais do geral – se tal afirmação pode ser possível. Todos sabemos disso. Mas, para elucidar o que vou demonstrar, acho mais comfortável evidenciar esta questão.

Mas, vamos lá.

Nota: Não fiz nenhuma pesquisa profunda sobre fatos e versões sobre a vida de John Lennon, e confesso que não assisti (ainda) a outros filmes que buscam na vida deste artista o seu enredo. Falo de filmes como Nowhere Boy. Se alguém que não assistiu Lennon Naked ainda se sentir interessado em fazê-lo após

ler isso, já está ótimo para mim.